quarta-feira, 23 de novembro de 2016

Capítulo 5




Não me lembro de ser muito amigo de Wagner antes do acidente, ele era o primo mais novo, tinha apenas 14 anos, quase chegando aos 15, vivendo aquela fase de adolescente em que eu já havia deixado para trás, Nicholas era mais próximo dele do que eu, pois mesmo sendo mais velho que Wagner, Nicholas tinha um espirito sempre jovial que o conectava com os jovens, mais do que com as pessoas de sua idade.
Hoje, Wagner está com 29 anos, e por isso sinto-me a vontade junto a ele. Ele fica ao meu lado, enquanto eu fito, sem ação, o tumulo de meu pai. Minha mãe não veio, eu pedi para que fosse assim, eu havia me estressado muito com ela, e não queria brigar em um cemitério.
_ Como aconteceu? – pergunto a Wagner.
_ Ele passou mal, quando a ambulância chegou, ele já estava desmaiado. Ele tinha adquirido diabetes e pressão alta há uns sete anos, ele não se cuidou muito, você conhecia seu pai, gostava de comer bem e sem privações... Quando chegou ao hospital, os médicos o estabilizaram, ele ficou um dia bom, mas depois ele piorou novamente, os médicos disseram que a única chance dele sobreviver seria fazendo uma cirurgia de emergência. Iriam fazer ponte de safena, não sei bem, algo para melhorar o funcionamento do coração de seu pai, mas... Ele morreu na mesa de cirurgia.
_ Três anos, se tivesse acordado apenas três anos antes eu teria me despedido dele. – digo.
_ Seu pai não te abandonou, nem você nem a sua mãe, saiba disso, ele também acreditava que você acordaria. – diz. Não sei se isso ajuda, saber que os últimos anos de sua vida foram perdidos, indo do hospital, para o trabalho, para o apartamento, economizando para mandar o filho em coma no hospital. Não era assim que eu queria que fosse, não era assim que deveria ter sido, ele deveria ter tido a chance de se aposentar, viajar, fazer seus churrascos de fim de semana, eu deveria ter tido a chance de me despedir...
            _ Wagner, eu sei que você já fez muito por mim hoje, mas posso te pedir mais uma coisa?-
Pergunto.
            _ Joseph, eu acho que já sei o que você irá pedir e antes de tudo eu quero que você pense bem, sua mãe te ama, ela saiu do controle, mas simplesmente porque ela te ama.
            _ Eu sei. – eu digo sem saber se devo continuar.
            _ Eu não sei onde Demetria está. - ele diz, respondendo exatamente o que eu queria perguntar. _ Apenas os parentes e amigos bem próximos sabem, e até mesmo estes não passam a informação, não importa para quem seja, nem mesmo para...
_ Para mim? – completo, ao ver que ele não continuou.
_ É. – diz sem jeito. _ Nem mesmo para você.
            _ Então você acha que eles não me passariam a informação? – insisto.
            _ Você pode tentar, mas pode ser que no fim seja apenas perda de tempo.
            _ Mas por quê?  Ela por acaso está se escondendo? - pergunto e ele hesita.
            _ A saída dela da cidade não foi nada fácil Joseph, ela sofreu muito e... – ele para de repente.
            _ E...?
            _ Ela queria que fosse algo definitivo. – ele diz não muito convincente,  como se escondesse algo, ou estivesse falando apenas a metade. _ Procurar ela pode não ser algo bom pra você.
            _ Ela já tem outra família? - pergunto. Pelo jeito que ele e minha mãe falam, é bem provável que ela já tenha outro alguém. Wagner para e parece pensar o que dizer.
            _ Muito se fala e pouco se sabe. Eu não posso lhe afirmar o que eu não sei.
            _ Me leve até os familiares dela, se não der em nada eu paro, eu esqueço, eu deixo para lá.
            _ Não prometa o que você não pode cumprir. - Wagner diz e eu entendo que ele não quer me ajudar. Volto a fitar o túmulo de meu pai, e penso no que ele faria, será que ele concordava com minha mãe ou será que ele me incentivaria a buscar Demi, mesmo com todos dizendo ao contrário? _ Eu te espero no carro. – Wagner diz após quase um minuto.
            Não demoro muito para ir encontra-lo no carro. Ficar ali, olhando para o túmulo de meu pai não adiantaria em nada. Ele não ressuscitaria, e eu jamais poderei dar meu adeus.
            A família de Demetria ainda vive na mesma casa. Antes de chegarmos lá, no percurso acabamos passando pela casa em que eu vivia, a casa continua igual, excerto pelo jardim, que agora não está mais tão bem cuidado. Minha mãe adorava jardinagem, sempre cuidava de suas plantas e flores com muito apego, tínhamos o jardim mais bonito da vizinhança.
            _ Eles destruíram o jardim de minha mãe. – comento, assim que passamos pela casa.
            _ Pois é... Sua mãe fez um jardim no terraço do prédio. – Wagner diz. _ Ficou um espaço lindo, verde no meio do concreto. Ela ia sempre lá, para relaxar. – diz. _ Até mesmo ensinou uns truques para minha noiva.
            _ Noiva? – pergunto surpreso. _ Você não disse que era noivo.
            _ É... – diz um pouco tímido. _ Ainda é algo novo, custou um pouco para todo mundo aceitar a ideia.
            _ Por quê?
            _ Ela é mais velha.
            _ Muito?
            _ Uns oito anos apenas. – ele dá de ombros.
            _ Ela tem a minha idade. – concluo, e quando paro para pensar, percebo o quanto isso é assustador, eu fui dormir com 23 anos e acordei com 37. Eu agora sou um adulto, praticamente estou na meia idade, isso não é nada legal.
            _ Sim, sua idade.        
            _ Eu a conheci? – pergunto.
            _ Acho que sim. – percebo que ele não quer entrar em detalhes, ou talvez ele só quisesse que eu saísse logo, já que acabamos de chegar à antiga casa de Demetria. _ Você acha que consegue ir sozinho? – pergunta.
            _ Sim, eu vou. – respondo.
            Saio do carro, vou até a porta, mas hesito antes de bater a campainha. E se minha mãe e Wagner estiverem certos? E se procurar Demetria fosse um erro?
            Eu já estou aqui, não há como fugir.
            Toco a campainha e não demora muito para que eu seja atendido.
            _ Meu santo Deus. – a mãe de Demetria me recebe com espanto. Ao contrario de minha mãe, a mãe de Demi não mudou praticamente nada, para ser bem sincero; a única diferença foi que antes ela tinha cabelo castanho claro e agora é totalmente loira. _ É você mesmo Joseph? – pergunta.
            _ Sim, sou eu. – confirmo. Ela fica me olhando sem crer por quase um minuto até voltar a reagir.
            _ Entre. – diz e me abre espaço para entrar.
            Entro. A casa não mudou muito, apenas os eletrodomésticos, que estão mais modernos.
            _ Eu não esperava você por aqui, não preparei nada. Você pode comer normalmente, não pode? – pergunta.
            _ Sim, mas não se preocupe com isso, já comi por hoje. Não tenho fome. – ela sorri fraco.
            _ Joseph, eu... – ela não continua.
            _ Você já sabe o porquê eu estou aqui, não?
            _ Sei. – ela responde. _ E não vou dizer que gosto disso, pois não gosto.
            _ Eu já sei o que minha mãe fez, peço perdão por isso. – digo. _ Eu só queria conversar com ela.
            _ Joseph, eu não tenho problemas com sua mãe, eu não sei se reagiria diferente dela se eu estivesse na situação que ela estava, e eu também entendo que depois de todos esses anos você queria reencontrar a Demetria, mas, eu não posso fazer isso.
            _ Fazer isso o que?
            _ Ela foi embora Joseph, ela tem os motivos dela, no começo não concordei, foi uma época difícil, mas hoje eu já a entendo, e é exatamente por entendê-la que eu não posso fazer isso, eu não vou lhe dar o endereço dela, eu a prometi que não faria e não farei.
            _ Ela pediu para que você não passasse o endereço para mim? – pergunto.
            _ Ela não quer que ninguém que possa...
            _ Passar o endereço para minha mãe? – completo.
            _ Entenda Joseph, não foi uma briga, foi uma perseguição, Demetria sofreu.
            _ Eu não vou contar para minha mãe.
            _ E você acha que após todo esse tempo esperando você acordar, ela vai te deixar ir encontrar com Demetria, sem perguntas, sem nada? – ela pergunta e eu hesito.
            _ Mas eu só quero conversar, eu sei que ela deve já ter uma família, mas...
            _ Você não sabe de nada Joseph, de nada. – ela diz e seu tom parece de dó.
            _ Ninguém me diz nada, ninguém me explica nada, ninguém quer que eu contate ninguém. Você não pode me julgar por não saber nada. – digo com o coração apertado. _ Por favor, nem que seja um número de telefone, por favor.
            _ Joseph, acredite, é para seu bem. – ela responde.
            Não consigo ficar mais na casa depois disso, mesmo com a mãe de Demetria tentando relevar e me agradar, como um pedido de desculpas pela sua negativa.
            Volto para o carro e não digo nada, mas vejo que Wagner espera que eu diga algo. Respiro fundo para não me descontrolar. Eu tinha finalmente ganhado alta, eu finalmente estava fora do hospital e o dia parecia que seria perfeito, pois eu finalmente teria as respostas que eu queria tanto ter, eu finalmente poderia retomar minha vida, mas não, minha mãe vive num apartamento horrível por minha culpa, meu pai morreu e não pude me despedir, eu não posso falar com minha noiva, ou melhor, ex-noiva, e todos, todos ainda parecem me esconder algo.
            Maldito acidente! Maldito acidente! Maldito eu! Porque eu não apertei o freio? Porque eu simplesmente não morri? Porque minha mãe não permitiu que desligassem aquelas porcarias de maquinas? Para quê acordar? Para quê ter alta.
            Não percebo, mas estou chorando.
            _ Sua mãe vai me matar por isso. – Wagner diz ligando o carro. _ Mas eu prometi seu pai que lhe ajudaria. – ele começa a dirigir.
            Sei que ele volta para o centro, mas não pega a rota de volta para o apartamento, ele vai para a parte mais boemia do centro, onde a maioria dos bares e boates se concentra. Vejo o quanto a cidade cresceu, os prédios estão maiores e as pistas mais largas, os nomes continuam os mesmo, mas é apenas isso, as lojas que eu conhecia não estão mais no mesmo lugar, lojas que eu nunca ouvi falar aparecem a cada esquina.
            Wagner para frente a um bar que já está aberto, mesmo ainda estando com sol alto no céu.
            _ Não sei se posso beber ainda, por causa dos remédios.
            _ Pare de falar Joseph, antes que eu me arrependa. – diz. _ Saia. – ordena. Eu saio e Wagner também. Ele entra no bar primeiro.
            _ Amor. – uma mulher vem e lhe abraça, não vejo seu rosto, pois ela é bem mais baixa que Wagner e como ele está a minha frente, ele a tampa. Os dois se beijam rápido.
            _ Amor, você se lembra dele? – Wagner pergunta, tirando o corpo da frente para que sua noiva possa me ver. Seu rosto me parece muito familiar, mas não me lembro de quem é até que eu escuto sua voz dizer meu nome.
            _ Joseph? – pergunta incrédula. _ Você recebeu alta.
            _ Marissa?
            _ Eu mesma.
            _ Sua noiva é a Marissa? – pergunto a Wagner.
            _ Sim. – Wagner responde tímido. Marissa estudou comigo e com Demetria no colégio, as duas era melhores amigas, inseparáveis.
            _ Isso é... – fico um pouco sem reação. _ Incrível. – Wagner parece rir aliviado. _ Parabéns para o casal.
            _ Obrigada primo. – ele sorri. _ Amor, o Joseph quer falar com a Demi. – diz.
            _ Claro que quer. – Marissa responde. _ Mas ninguém quer deixar, não é? – começa a falar no meio de um suspiro.
            _ Todos dizem que é melhor eu não procura-la.
            _ E eles têm razão. – confirma Marissa.
            _ Amor. – Wagner repreende.
            _ Ei, razão todos tem, tanto os que não querem que Joseph a encontre, tanto Joseph que quer encontra-la. – Marissa pondera.
            _ Você precisa escolher um lado, amor. – Wagner diz.
            _ Olha, você vai descobrir tudo mais cedo ou mais tarde. Todos querem te proteger do que você vai encontrar, mas, não vai adiantar, nem que sua mãe me esfaqueie ou use alguma das plantas que ela cultiva no terraço para me envenenar, eu vou lhe dar o endereço. – Marissa responde e eu nem sei como expressar minha felicidade, de tão tamanha que ela é.
            Marissa vai até o balcão do bar e pega um papel e uma caneta, escreve o endereço e me entrega.
            _ Só uma pergunta. – peço. _ O que eu vou encontrar é tão ruim assim?
            _ Sim. – Marissa não hesita. _ Mas se você esperar a explicação você verá que não é exatamente assim. – responde. _ Não importa o quão ruim pareça Joseph, eu te juro, existe uma explicação.

Continua


Babii: Talvez nos próximos capítulos você comece a entender a Denise, ou comece a odiá-la mais ainda kkkkkkk. Muito obrigada por comentar bjsssssss

terça-feira, 22 de novembro de 2016

Datas das próximas postagens

Olá a todas, ontem, ao entrar no blogger pelo celular, percebi que quem lê as fics pela versão mobile não consegue visualizar o que tem na barra lateral do blog, pensando nisso, resolvi postar aqui as datas das próximas postagens, já que esta é uma das informações da barra lateral e que creio ser de relevância para quem acompanha a história.
Deixo claro que caso ocorra algum imprevisto, as datas podem ser alteradas, mas a intensão é postar tudo no dia correto:

Próximas postagens:

Capítulo 5 de Encontro com o Passado (23/11)

Capítulo 6 de Encontro com o Passado (28/11)

Capítulo 7 de Encontro com o Passado (1/12 )

Capítulo 8 de Encontro com o Passado (03/12 )

Capítulo 9 de Encontro com o Passado (04/12 )

Capítulo 10 de Encontro com o Passado (06/12 )

Capítulo 11 de Encontro com o Passado (09/12 )

Capítulo 12 de Encontro com o Passado (11/12) - Antepenúltimo Capítulo

Capítulo 13 de Encontro com o Passado (15/12) - Penúltimo Capítulo

Capítulo 14 de Encontro com o Passado (16/12) - último Capítulo


obrigada e boa leitura ;)

domingo, 20 de novembro de 2016

Capítulo 4



Eu não sabia, mas este dia seria muito especial.
Antes que eu pudesse sair os funcionários fizeram uma pequena festa para mim. Balões, bolo, salgados e refrigerante. Foi à primeira vez em três meses que realmente comi coisas com sabores e temperos fortes. Sem duvidas o dia tinha começado bem.
Após a festa eu, minha mãe e um dos meus primos, Wagner, filho da irmã de meu pai (que de todos, para mim foi o que menos mudou na aparência, sempre alto, sempre forte, moreno, cabelo liso, nunca usa barba, sempre usando terno) fomos até a garagem do hospital. Entro no carro, fico no do passageiro, minha mãe senta no banco de trás e Wagner dirige.
Pelo que lembro o hospital não é muito perto de minha casa, teríamos que atravessar toda a parte central, em que o hospital se localiza, depois mais um bairro e enfim chegaríamos onde moro. Porém me surpreendo quando após duas quadras, meu primo começa a desacelerar o carro e estacionar na rua.
_ Vamos visitar alguém? – pergunto.
_ Não. – ele responde, puxando o freio de mão. _Estamos em sua casa.
Eu não entendo. O que não é algo tão incomum ultimamente. Ainda estamos no centro, em uma parte bem movimentada, fico imaginando porque eu moraria por aqui. Minha mãe sempre adorou nossa casa, ela sempre viveu no subúrbio e nunca quis sair de lá. Meu coração dispara quando me lembro de que Demetria queria viver no centro, ela estava começando a olhar alguns apartamentos nesta região, pois a editora para qual ela trabalhava (ou trabalha, não sei) fica perto daqui, teria ela comprado um? No fim sua ausência no hospital poderia ter algum motivo a mais do que ela simplesmente ter me abandonado. Ela poderia estar em alguma viagem por causa do trabalho, talvez ela esteja temporariamente incomunicável, talvez algo tenha acontecido? Eu não sei, eu ainda não me acostumei com a ideia de que ela realmente me abandonou, apesar de compreender que é a mais provável.
Saio do carro e vejo minha mãe pegando a chave em sua bolsa, gosto de pensar que ela simplesmente tem a copia da chave, mas começo a me sentir um iludido. Demetria tinha ido embora e por algum motivo minha mãe vive aqui, mas... É tão ruim assim sonhar?
Entramos no prédio, e este não é dos melhores, parece sujo, não há porteiro, é abafado.
_ Não há elevador. – minha mãe fala com pesar em sua voz.
_ Eu ajudo. – diz Wagner. Ele fica ao meu lado. _ Se apoie em mim. – Diz e eu faço. Não tenho dificuldades para andar, utilizo a bengala por precaução, pois alguma vez, vezes cada vez mais raras, eu perco o equilíbrio. Mas subir escada ainda é algo me exige muito de mim.
Subimos dois andares e entramos na porta que fica a direita da escada. Minha mãe abre o apartamento, que tem a aparência de ser bem pequeno. Wagner ainda me ajuda a entrar, mesmo não mais precisando de seu apoio.
Ele me leva até o sofá, que fica quase encostado na porta de entrada, apenas um passo nos impede de esbarrar nele. O sofá é o mesmo da casa da minha mãe, a antiga casa de minha mãe, porém aqui só coube uma parte dele, já que este era grande e o apartamento é realmente minúsculo.
A sala é acoplada com uma cozinha bem pequena, e do lado esquerdo tem três portas, onde creio que ficam os quartos e o banheiro. Pelo menos assim espero.
Sento-me no sofá.
_ Tia, precisa de mais algo? – pergunta.
_ Não querido. Muito obrigada por hoje, mas já está tudo bem.
_ Tudo bem, qualquer coisa você sabe onde me encontrar. Tchau Joseph.
_ Tchau Wagner. – Wagner sai e nos deixa sozinho.
_ Wagner é um bom moço, foi de grande ajuda hoje. – minha mãe não se senta. _ Quer sopa?
_ Não, mãe, chega de sopas, fora que ainda estou cheio da festa.
_ Ah sim, claro. – ela sorri. _ quer suco? Algo? Qualquer coisa...
_ É aqui que você mora agora? – pergunto. Ela percebe que quero conversar e não comer ou beber e se senta ao meu lado.
_ É mais perto do hospital.
_ E a casa da família, está com papai? – pergunto, se os dois se separaram provavelmente um teria que sair da casa do outro e talvez minha mãe tenha decidido sair, talvez meu pai tenha construído outra família, o que não é algo bom, pelo menos não para mim, mas, foram 14 anos, é possível que isso tenha acontecido.
_ Vendi.
_ Vendeu? – pergunto chocado. _ Mas aquela casa era da família. – insisto. _ Eu nasci naquela casa.
_ Eu sei, mas... Foi necessário.
_ Papai aceitou isso?
_ Precisávamos do dinheiro.
_ Para quê? – pergunto e ela hesita. _ Mãe, foi por mim?
_ Depois de um tempo o plano de saúde parou de cobrir sua internação... – começa. _ o bairro era muito valorizado, a casa estava em ótimo estado, nos redeu muito dinheiro. – mais um efeito colateral do meu acidente. Eu causei tristeza a essa família, eu separei a minha família.
_ Há quanto tempo?
_ 9 anos. – ela responde. _ Seu primo nos acolheu, ele mora no apartamento de cima, é no ultimo andar, então é maior que este, depois de pouco tempo esse apartamento vagou. O preço não era muito alto, compramos. – eu não digo nada. _ Parece ruim, mas a nossa casa era longe, era uma viagem todos os dias para chegar ao hospital, morar aqui me economizou muito tempo, e o apartamento é bom, o prédio parece ruim, eu sei, mas o apartamento é bom. – ela garante.
_ Papai não aceitou isso, não é? Por isso vocês se separaram. – concluo, olho a minha mãe, ela me olha em choque, peguei-a de surpresa. _ Não é mãe?
_ Porque você acha que nos separamos? – ela pergunta. _ Seu pai sempre foi o amor da minha vida, e ele também sempre nos amou, ele também viu a necessidade de mudarmos para cá, não digo que ele ficou feliz, ele sempre foi acostumado a ter quintal, poder dar churrascos no fim de semana, mas ele sabia que precisávamos mudar.
_ Então porque ele não está aqui? Porque você fica nervosa e triste quando fala dele? Na verdade, porque todos te deixam nervosa? Nicholas, Demetria...
_ Ah, por favor, Joseph, lá vem você, sempre com Nicholas, sempre com Demetria. – ela se estressa. _ Demetria está no seu passado, passado Joseph, você recebeu uma nova oportunidade, você pode recomeçar sua vida com outro alguém, e você insiste em Demetria.
_ Eu só queria conversar com ela, eu já entendi que ela foi embora mãe, eu já entendi. Mas a nossa... Separação não aconteceu como esperávamos... Eu só queria ver como ela está...
_ Bem, ela está bem. – minha mãe grita. _ Bem e longe de nós. Se ela quisesse te ver ela veria.
_ Ela sabe que acordei? – minha mãe hesita.
_ Deve saber. – dá de ombros.
_ Mãe...
_ Eu já falei para você parar com essa bobagem Joseph, você não sabe de nada, você não sabe o que ela fez.
_ Como você espera que eu saiba o que aconteceu se você não me diz nada?
_ Ela te traiu, ela te abandonou, ela enganou a nós todos. – ela diz.
_ Como assim? – pergunto.
_ Eu pensava que Demetria era uma pessoa e no fim ela era alguém totalmente diferente, precisou passar por uma tragédia para descobrir quem ela verdadeiramente era. Você está feliz agora Joseph?
_ Ela me traia? – pergunto.
_ Esquece-a. – minha mãe pede. _ Pelo amor de Deus, Joseph, esquece-a. – eu não falo nada por alguns segundos.
_ E Nicholas?
_ Outro traidor... Outro que nos abandonou... Foi embora, como sempre fazia, nunca conseguiu se responsabilizar pelo que fez.
_ Como assim se responsabilizar?
_ Ele te fez isso...
_ Mãe, eu... Nicholas é seu filho também.
_ E você acha que eu não sei disso?
_ E você o culpa pelo que aconteceu comigo? – nunca escutei um absurdo tão grande em minha vida.
_ Você sempre foi responsável, nunca andou sem cinto de segurança, sempre na velocidade correta, nunca falou no telefone ao dirigir, mas... Naquele dia, Nicholas e Demetria, tudo o que eles fizeram foi te encaminhar para o caminho errado, eles fizeram isso a você Joseph.
_ Eu que atendi ao telefone, eu que acelerei o carro, eu que não prestei atenção no que deveria, eu que bati o carro.
_ Porque você se deixou levar por eles!
_ Mãe! – grito, agora eu entendia tudo. Demetria não me traiu de verdade, nem mesmo me abandonou foi minha mãe a culpou pelo que me aconteceu, por isso ela deve ter ido embora, e o mesmo serve para Nicholas. _ Eu não acredito que você é minha mãe. Você não era assim.
_ Assim como Joseph? Justa?
_ Isso não é ser justa, culpar a inocentes, afasta-los, você... Foi por sua culpa que eles não vieram me visitar, não é?
_ Não diga o que você não sabe Joseph.
_ Não, eu sei muito bem o que estou falando. Você os afastou. – digo. Minha mãe se levanta, e vai para a cozinha, com dificuldade, me levanto também e vou atrás dela. _ Você fica nervosa ao falar sobre eles, porque você os culpa e você deve ter os infernizado tanto que eles foram embora. – digo.
_ Cale sua boa Joseph.
_ Eles nem devem saber que eu acordei. Por isso eles não vieram. Ninguém me abandonou ninguém me traiu. Você que os afastou. – eu me seguro para não explodir. _ E papai? O que ele fez? Você também acha que ele foi culpado? Porque você o afastou? Pelo menos para ele você teve a decência de falar que eu acordei? – grito.
_ Seu pai morreu Joseph. – minha mãe grita e começa a chorar compulsivamente. _ Seu pai morreu!

Continua


Babbi: Como ele lidará com as mortes e nascimentos é algo que descobriremos logo no próximo capítulo, muitas emoções ainda ;) Muito obrigada por comentar. Bjsss

Nessa: Postado ;) Obrigada por comentar.  Bjsss

domingo, 13 de novembro de 2016

Capítulo 3



Nesta noite não dormi, simplesmente não consegui, afinal de contas eu já havia dormido por quatorze anos, mais de uma década perdida deitado nesta cama de hospital. O que eu perdi? Quem eu perdi? Demetria ainda me ama? Ela ainda me espera? E minha família? Meus pais estão bem? E meu irmão, meu Deus, meu irmão, o que Nick fez de sua vida? Ele já não é um moleque, mas ele estaria ainda irresponsável como antes ou teria se tornado um homem de vez?
Entro na sala do psicólogo que vai me atender, assim que o vejo, percebo que não quero falar com ele, eu simplesmente não conseguiria fingir que não sei se nada ou passar por várias consultas, eu quero sair daqui, rever a minha família.
_ Bom dia. – ele diz.
_ Bom dia. – respondo.
_ Joseph, eu sei que os últimos dois dias foram cansativos, eu não gostaria de lhe fazer passar por mais estresse, mas terei que lhe forçar um pouco...
_ Eu já sei que perdi quatorze anos da minha vida, pode pular esta parte. – digo e o pego de surpresa.
_ Quem lhe falou?
_ Não interessa. – digo um pouco bruto. _ perdão, eu não quero soar como um idiota, só que prometi que não falaria. – justifico-me.
_ Infelizmente você recebeu a noticia de uma forma que não é a mais correta, mas espero que possamos continuar nossas seções sem mais atrapalhações.
_ Porque preciso destas seções? – pergunto.
_ Foi quatorze anos, Joseph, muita coisa aconteceu. – ele diz. _ Você precisará se adaptar a um novo mundo.
_Eu só quero ver minha família, com o resto eu me adapto depois.
_ E você os verá, mas você foi dormir em uma década e acordou em outra, o mundo andou, as coisas não estão mais como antes, você logo poderá sair deste hospital, e eu preciso lhe preparar para o que vai encontrar.
_ Algo de ruim aconteceu com minha família?
_ Muita coisa aconteceu, coisas boas e ruins, Joseph, e não apenas com sua família. Acalme-se. Dê-me à oportunidade de lhe ajudar, percebo que você não está muito aberto a minha ajuda, mas eu preciso que você me dê uma chance. Você é um milagre, seus exames físicos e neurológicos foram ótimos, a única coisa que você precisará fazer, além de passar por mim, será a fisioterapia, para que você recupere os músculos que perdeu e assim volte a andar, volte a segurar coisas com sua mão, levantar seus braços sem ter que se esforçar tanto, todos os movimentos que lhe parecem quase impossível hoje em dia... Eu posso te ajudar na sua parte mental, mas isso só poderá acontecer quando você perceber que precisa se abrir, precisa permitir que eu o ajude.
_ Me desculpe. – peço. _ Eu... Não sei por que estou agindo desta forma.
_ Você passou por muita coisa, é compreensivo seu comportamento, uma das minhas funções é fazer com que tudo o que você terá que enfrentar daqui para frente, seja menos traumático. – apenas concordo.
_ O que mudou? – pergunto agora calmo.
_ O que não mudou? – ele sorri. _ Bom... Tudo bem, você provavelmente está querendo saber sobre sua família. – ele para alguns segundos. _ Sua família não é a mesma que você deixou.
_ Alguém morreu? – pergunto, segurando para não fraquejar. Ele não diz nada de imediato, apenas olha para alguns papeis em sua mão.
_ Talvez... – ele começa.
_ Isso quer dizer um sim, não é? Você não hesitaria em falar um não. – digo.
_ Eu não estou aqui para lhe dar notícias ruins, estou aqui para lhe preparar para as mudanças. – ele diz. _ E sim, talvez você tenha perdido alguns familiares.
_ Alguns? – deixo minha voz de desespero transparecer. _ Então mais de um morreu? – pergunto.
_ Eu não falei em morte, Joseph, há muitas maneiras de se perder pessoas... Foram 14 anos, você pararia 14 anos da sua vida, esperando por alguém, sendo que todos que estão a sua volta dizem que não vale a pena? – ele pergunta.
_ O que você quer dizer com isso?
_ As chances de uma pessoa acordar do coma após alguns dias são promissoras, após alguns meses pode acontecer, após um ano, é difícil, após o quinto, raríssimo, após do decimo?... Nenhum médico aqui acreditava que você acordaria, alguns familiares acreditavam que desligar as máquinas que o mantinha vivo, era a melhor opção, menos gastos, menos desgaste, menos sofrimento...
_ Queriam me matar?
_ Quase ninguém acreditava que você estava realmente vivo. – responde.
_ Minha mãe estava aqui...
_ Ela nunca deixou de acreditar.
_ Só ela?
_ Não, mas sem duvidas ela foi a que mais lutou para que mantivessem seu tratamento, contra tudo e contra todos, ela não iria deixar suas maquinas serem desligadas.
Minha conversa com o psicólogo não rendeu muito mais do que isso, e talvez eu devesse ficar feliz, pelo menos minha mãe estava ali.
Volto para o quarto e lá a enfermeira me alimenta com uma sopa, insossa, nada agradável de comer, mas como, estou com fome e preciso me recuperar o mais rápido possível.
 Assim que termino de comer, tenho minha primeira boa notícia dos últimos dias. Verei minha mãe.

Assim que minha mãe entra no quarto, vejo o quanto ela mudou, antes do acidente ela era uma coroa enxuta, cabelo castanho e liso, sempre arrumada; levemente cheinha, sem rugas, mas agora seu cabelo está com a raiz toda branca, seu cabelo parece grande e está amarrado. Ela tem muitas rugas e olheiras, está muito magra e sua boca está fina, ela veste um vestido largo, que parece caber duas dela dentro dele. Fico surpreso, seria apenas a passagem do tempo, ou seria eu? Eu a fiz sofrer e por isso o tempo lhe castigou tanto? Ela sorri e começa a chorar, ainda na porta.
_ Mãe. – eu digo, tentando ignorar sua clara mudança física, pois eu tampouco estava como antes, para ser bem sincero, eu estava bem pior, minha mãe pelo menos está de pé, magra, porém ainda tem seus músculos.
_ Meu filho. – ela vem até a mim e me abraça, vejo que ela não fica a vontade, pois tem que se curvar, já que estou sentado na cadeira de rodas. Ela me abraça forte e mesmo um pouco desconfortável, ela não me solta rápido.
Quando me solta ela começa a tocar meu rosto, minha testa, minhas sobrancelhas, minha bochecha, que agora está murcha, meu queixo...
_ É você meu filho. – ela chora. _ Você está acordado. – deixo-a chorar e me tocar o quanto quiser.
_ Eu estou mãe, eu estou acordado.

1 mês depois

Em um mês eu pude perceber muita coisa, uma delas é que Demetria não mais me esperava, ela não veio me visitar nenhuma vez e sempre que eu tocava em seu nome, minha mãe ficava nervosa e mudava de assunto. Também não vi meu pai, nem mesmo Nick, creio que minha mãe e meu pai se separaram, pois ela ficar chateada ao falar sobre ele. Segundo ela, Nick se mudou para longe, percebo que eles também não devem estar muito bem, pois ela também fica nervosa ao falar sobre ele.
Recebi algumas visitas de primos, e alguns amigos, meu tio, o que me contratou em sua empresa, foi o último a vir me visitar. Ele foi um pouco frio durante sua visita, e foi perceptível que ele e minha mãe não mais se davam bem. Ao sair do hospital eu teria muita coisa para descobrir.
Outra coisa que percebei foi que ir ao psicólogo não me traria notícia, pelo menos não da minha família. Porém sei sobre todos os presidentes que perdi: GorgeW. Bush e Barack Obama duas vezes, se bem que quando eu sofri meu acidente eu vi o primeiro ano de mandato de Bush, sei que Donald Trump será o nosso novo presidente. Sei quais são os novos ídolos da música, e quais são os novos estilos da moda, o que mudou muito, descobri novas gírias, mas nada me surpreendeu mais do que a tecnologia, nada mais de teclas ou celulares robustos, agora são finos e se eu quiser fazer algo eu toco na tela, imagina isso? Eu toco na tela, CD? DVD? Aparentemente quase ninguém mais compra CDs e o DVD foi substituído por Blu Ray, os computadores agora não são mais de CPU, mas sim notebooks, e segundo meu psicólogo até mesmo estes começaram a serem obsoletos. É tanta coisa...
Na fisioterapia descobri o quanto poder andar é algo valioso, depois de duas semanas finalmente consegui sair da cadeira de rodas, mas apenas para começar a usar o andador (e isso me fez sentir um velho). Agora já posso carregar coisas leves, como livros, copos, pratos, me alimentar, na seção de ontem eu consegui levantar por longos três segundos um peso de 2kg, o que deixou a todos muito felizes, principalmente eu.

2 meses depois

Eu já estava cansado, três meses dentro de um hospital não é algo fácil, minhas seções com o psicólogo estava ficando mais espaçadas, apenas uma vez por semana, já minha fisioterapia estava ficando mais e mais pesada. Eu pouco via o Doutor Jacob, mesmo ele quase sempre vindo me visitar depois de seu expediente.
Eu já não estava mais no andador, mas sim na muleta, mas os fisioterapeutas estavam começando minha transição para a bengala.
Eu ainda estava magro, mas agora estou forte, consigo levantar mais de 7kg de peso.

Nesses últimos três meses minha mãe ficou no hospital todos os dias, não demorou muito para ela revelar que não estava mais trabalhando.

Eu já conhecia praticamente a todos do hospital, de funcionários a pacientes. Eu claramente tinha perdido pessoas importantes na minha vida, mas aqui, nessas paredes brancas eu também havia conhecido pessoas que gostaria de levar para esse retorno de vida.

Faz apenas duas semanas que tive autorização para ver TV. E esta também mudou, as imagens tem mais resolução, tudo parece mais tecnológico.


Mais um dia amanhece e eu me preparo para a rotina que virá, porém antes mesmo do café da manhã, Jacob entra em meu quarto, fico surpreso, pois geralmente ele vem durante a noite.
_ Joseph, nosso homem milagre. – ele ri. Ganhei esse apelido por aqui, pois todos acreditam que o que aconteceu comigo (acordar do coma após 14 anos, sem sequelas sérias), é um milagre, e eu não duvido que seja mesmo. Eu até mesmo dei uma entrevista para o jornal local que se interessou pela minha história.
_ Olá doutor. – digo. _ Veio cedo hoje. – reparo.
_ Sim, vim cedo, mas existe um motivo especial, não estou aqui apenas como amigo, mas principalmente como seu médico. – ele diz.
_ O que aconteceu? – pergunto preocupado.
_ Nada de ruim. – ele não hesita em me acalmar. _ Trago boas notícias. – ele diz. _ Você ganhou sua alta, Joseph, você já pode voltar para sua casa.

Continua


Babii: triste mesmo, e como você disse, Demi não está mais com ele. Bom, agora Joseph tem 37 anos. Obg por comentar ;)

Diana: Sim, bem triste para ele, mas aos poucos ele vai se acostumando e vai descobrindo o que perdeu. Obg por comentar ;)

sexta-feira, 4 de novembro de 2016

Capitulo 2


Eu estava confuso, pouco se falava sobre o que havia acontecido. Os médicos me tratavam de maneira estranha, como se estivessem tomando cuidado com que iriam falar, eu ia de sala em sala, fazendo vários exames, e o que mais me incomodava em tudo isso era o fato de que eu só conseguia sair de um lugar para outro na cadeira de rodas.
O primeiro dia foi estressante, mas nada se compara com o que eu vi quando a noite chegou.
Uma enfermeira me ajudou a despir-me, o que pra mim foi humilhante. Ela mantem um sorriso simpático, mas eu não tenho mais energia para retribui-la. O Box do banheiro do hospital é grande, grande o suficiente para que eu, a cadeira de rodas especial para banho, em que eu estou sentado, e a enfermeira possamos entrar nele sem ficarmos apertados. Uma pia num canto, um vaso sanitário no outro e, pela primeira vez, vejo um espelho, ele é pequeno, mal deve ter meio metro, mas ainda assim, consigo ver-me. Não vejo meu corpo completo, apenas do inicio do meu quadril até o meio de meu pescoço.
Fico olhando-me por vários segundos até concluir que o que vejo é real, aquele no espelho realmente sou eu.
Nunca fui musculoso, nem tampouco eu era gordo, mas nunca me vi assim, praticamente pele e osso.
_ Me traga aquele espelho. – peço a enfermeira, ela me olha e seu olhar é de compaixão. _ Traga-me aquele espelho. – repito, ao perceber que ela hesita.
_ Ele esta pregado na parede. – ela responde calma. _ Depois o deixaremos se olhar no espelho. Mas primeiro, vamos tomar banho?
_ O que aconteceu comigo? – pergunto, ignorando sua última fala.
_ Você sofreu um acidente. – ela responde.
_ Mas o que mais? Porque eu estou assim? – insisto já irritado.
_ Amanhã o doutor falará com você...
_ Não! – grito. _ Porque eu não vi ninguém? Onde está minha mãe? Meu pai? Meu irmão? Minha noiva?
_ Senhor Jonas, eu sei que você está estressado, o dia hoje foi cansativo, mas amanhã será bem melhor...
_Porque eu não ando?
_ É algo temporário. – diz, pela primeira vez, realmente me respondendo. _ Vamos para o banho? – pergunta e eu me sinto como um bebê.
Estou cansado, deixo que ela me lave. Não consigo olha-la a nenhum momento, mesmo sabendo que ela provavelmente já está acostumada a essas situações.
Após o banho ela me seca e me ajuda a por uma roupa, que não é muito agradável, é o tipo de roupa que todo paciente por aqui usa, parece uma camisola, porém, digamos que, a parte de trás é mais ventilada do que eu gostaria que fosse.
Volto para meu quarto, apenas para ser deitado na cama, que não é nada confortável e voltar a ser espetado por várias máquinas que me monitorariam.
_ Posso ligar a televisão? – pergunto a enfermeira antes que ela me deixe sozinho. Ela hesita.
_ Podemos colocar algum filme, caso você prefira. – ela responde.
_ Não precisa tanto incomodo. – digo. _ Eu assisto qualquer coisa que estiver passando mesmo. – completo.
_ A televisão aqui tem uma imagem péssima. – ela sorri nervosamente. _ talvez um filme da sua escolha seja melhor.
_ Eu não sei qual filme escolher. – digo um pouco impaciente. _ Pode me trazer um jornal, uma revista, um livro? Qualquer coisa que me distraia. – peço.
_ Irei providenciar. – sorri e sai do quarto.
Maldita hora que não desacelerei o carro para entrar naquela curva. Demetria deve estar com raiva, e pela imagem que vi no espelho, receio que tenhamos que cancelar o casamento, eu não poderia subir ao altar parecendo uma caveira.
_ Olá, Joseph. – entra o mesmo médico que me acompanhou durante todos os exames, ele agora não está usando seu jaleco. Ele sempre parece feliz, sempre sorridente, sempre entusiasmado, queria acompanha-lo nesta alegria, odeio ser o chato, mal humorado do lugar.
_ Olá, doutor. – digo, não com o mesmo animo dele, mas sorrindo, falsamente, mas o que vale é a tentativa, não é?
Ele se senta na cadeira ao lado de minha cama.
_ Estou fora do meu turno agora. – ele diz. _ pode me chamar de Jacob. – diz, não digo nada, apenas concordo. _ Sabe Joseph, eu não deveria conversar com você agora, pois provavelmente o deixarei mais confuso ainda, tenho consciência que estou colocando a carroça na frente dos bois, mas você me tornou um homem melhor, eu precisava falar com você. – fico sem ação e ele ri. _ Eu falei que lhe deixaria confuso. – volta a ri e eu acabo rindo junto, e desta vez verdadeiramente. _ Você é jovem, e muito escutei falar sobre você, enquanto cuidei de seu caso. Um cara ovo, mas com a vida inteira já programada, você era um jovem até mesmo bem sucedido, eu já tinha me formado quando você chegou aqui, isso é obvio, – ri fraco. _ mas eu não tinha metade da maturidade que você possuía. Quando meu chefe me colocou no seu caso, eu me senti poderoso, eu apenas tinha duas semanas de serviço e já seria colocado em um caso grave. Eu fiz o meu melhor, claro, mas ali eu vi o quanto eu não era o que eu pensei que era. Eu não sou um herói, nem O Imbatível Jacob, o amor que tinha a sua volta era algo que eu nunca tive. A força que você teve eu não sei se eu teria, eu tive tempo para refletir sobre o porquê de eu ter decidido ser médico, e percebi que era muito mais do que mostrar um diploma, ou poder me exibir com meu jaleco, ser chamado de doutor, eu me formei para salvar vidas como a sua, Joseph, salvar pessoas boas como você. – demoro um pouco para começar a falar, após Jacob finalizar.
_ Eu fico lisonjeado com suas palavras, eu não fazia ideia que tinha causado tal impacto. – digo. _mas... Eu realmente estou confuso. – completo. _ E eu nem mesmo sei com o quê. – ele ri.
_ Eu sei, eu estou me adiantando, amanhã será um dia cheio, não farei plantão como fiz hoje, mas ficarei com você apenas durante a noite, eu queria falar com você enquanto você está mais calmo.
_ Eu sinto como se todos estivessem me escondendo algo. – confesso. _ Cadê minha mãe? Eu escutei a voz dela ontem, doutor, porque eu não a vi hoje? E meu pai? Meu irmão? E minha noiva? – meu coração se parte ao me lembrar de Demetria, eu queria tanto vê-la.
_ Sua mãe estava aqui ontem, foi ela que nos alertou sobre o seu despertar. – ele afirma. _Mas hoje precisávamos que você fosse inteiramente nosso, mas você verá sua mãe. Não se preocupe.
_ E os outros?
_ Amanhã você passará por um psicólogo, ele poderá lhe esclarecer melhor, e logo após você poderá rever sua família. – ele diz.
_ Não. Eu já estou farto disso. Doutor há algo errado aqui. – me seguro para não chorar, todo o cansado, a falta de rostos conhecidos, o que eu vi no espelho, minhas pernas, eu me sinto tão frustrado, vazio, sozinho e pior, me sinto enganado, ninguém me diz nada, eu só quero saber o que aconteceu. _ Diga-me algo, eu... Porque meu corpo está assim? Estou puro osso, meu corpo inteiro dói, porque tantos exames? Porque eu não posso andar? Nem mesmo televisão eu posso ver! Eu só quero a minha família, eu só quero a verdade.
_ E você a terá, mas apenas quando estiver pronto.
_ Doutor, você acabou de me dizer que me considera, você diz que eu lhe ajudei, por favor, se eu realmente signifiquei ou significo algo em sua vida, me diga o que aconteceu, e eu não falo sobre o acidente, pois eu sei disso, eu me lembro de bater o carro. Eu quero saber o que aconteceu após isso, eu quero saber o que tanto me escondem.
_ Você diz que se lembra do acidente. – ele começa. _ e depois? O que mais você se lembra?
_ Nada, apenas de ter acordado aqui, preso por um monte de fios.
_ O que você acha que aconteceu?
_ Doutor... – quero começar a reclamar.
_ Apenas responda. – ele me interrompe.
_ Eu desmaiei, e fui internado aqui, é isso? – pergunto quase certo que não é só isso.
_ Você entrou em coma, Joseph. – ele diz, após pensar um pouco. Fico sem reação, meu queixo até cai um pouco, em coma? Meu Deus, isso quer dizer que meu casamente pode até mesmo já ter passado e isso justificaria as dores no corpo, o emagrecimento e a fraqueza.
_ Por quantos dias? – pergunto na esperança de que tenha sido no máximo cinco dias, e assim eu ainda teria dois dias para me recuperar e me casar com Demetria.
_ Muitos. – ele responde, fazendo com que toda minha esperança se esvaísse.
_ Quantos meses? – pergunto, sentindo um nó na garganta.
_ Você receberá mais informações amanhã, seu psicólogo é um dos melhores do estado, ele sem duvidas falará melhor com você. – diz.
_ Doutor, quantos meses? – insisto e ele hesita e muito. _ por favor.
_ Isso pode me custar caro, Joseph. – ele diz.
_ Por favor, eu prometo não falar com ninguém.
_ Duvido muito. – ele diz.
_ Um ano? – pergunto e torço para que ele comece a rir e me diga que é uma grande brincadeira, ele parece ser do tipo que ama pregar peças a todos.
_ Não Joseph... Foram quatorze.
_ Meses? – pergunto, não querendo aceitar outra possibilidade.

_ Anos.