quinta-feira, 12 de novembro de 2020

Capítulo 4: Rosa (Red blood lipstick)

Atenção! Essa história aborda assuntos como abuso, sexo, drogas e violência, e pode não ser adequado a todos. Por favor, se algum desses assuntos é gatilho para você, não prossiga com a leitura, e caso você seja menor de idade, não leia esta história, há muitas outras mais indicadas para você!


Agradeço pela compreensão, e aos que podem, boa leitura.


Para todos que conheciam a família que morava na casa em uma rua sem saída no tranquilo bairro familiar, aqueles pais e aquelas crianças educadas, eram o exemplo de família perfeita. O pai trabalhava como corretor de imóveis, e sempre andava muito arrumado e sorridente; a mãe, dona de casa, era um exemplo de dedicação aos filhos, sempre presente nas reuniões com os professores, sempre indo nas festas dos amiguinhos dos filhos e sempre ajudando as outras mães em tudo o que precisavam. Os filhos, dois meninos mais velhos e gêmeos e uma menina, a caçula, eram extremamente educados. Cheios de "por favor", "obrigado", com roupas impecavelmente limpas e cabelos castanhos com corte perfeitos, eles sempre eram colocados como exemplos a serem seguidos pelas outras crianças.

O que as roupas, os sorrisos, os domingos na igreja e a educação admirável escondiam, eram dias e noites de torturas.


Não existia uma justificativa, nem mesmo a tentativa de uma, o processo era o mesmo desde muito pequenos, tanto que numa certa idade as crianças entenderam que aquilo deveria ser normal.


Os pais de Rosa a deixava passar fome por dias a fio, a mesma tinha ossos pontudos, que eram escondidos pelas roupas, na sua maioria, vestidos bufantes e cheios de relevos e cores, que ela era obrigada a usar quando saia de casa, ela os odiava com todas as forças. Quando os filhos podiam comer, comiam restos, algumas vezes coisas estragadas, intragáveis, mas após mais de 10 dias sobrevivendo com alguns pingos de água, contatos num conta gotas, até mesmo pedra parecia apetitoso.


Na escola, Rosa e os irmãos tentavam se alimentar, bebiam água o tempo todo até sentirem que o estômago estava cheio de líquido, mas os pais nunca lhes davam dinheiro para que comprassem o que comer, e como estudavam em escola particular, não tinha como comerem de graça, eles tinham que ficar pedindo pedaços dos lanches dos amigos mais próximos. Isso os sustentavam durante o ano letivo, mas quando as férias chegavam...


A tortura física também era constante. Chicotadas, noites acordados obrigados a ficarem ajoelhados... Os espancamentos sempre se limitavam a partes do corpo que poderiam ser facilmente escondidas com roupas. Os atos de maus-tratos não eram cometidos apenas pelo pai, mas também pela "bondosa e dedicada" mãe, que parecia ser a que mais gostava de cometer tais atrocidades.


Rosa só foi resgatada quando já estava para completar 12 anos, um dos seus irmãos mais velho, na época já com 16 anos, adoeceu. Parecia ser apenas mais uma das milhares de gripes que eles já tiveram, mas o constante desgaste físico causados pelas torturas e dieta precária, não permitia que o corpo oferecesse bons anticorpos. Como nada foi feito enquanto o menino apenas espirrava, tinha febre e dores de cabeça, a doença evoluiu. Quando o irmão foi encaminhado ao hospital (apenas após uma das professoras contactar os pais, pedindo para que algo fosse feito, o que os deixou sem saída) o mesmo já tinha uma pneumonia grave. Os médicos, desconfiados do estado do menino, denunciaram ao conselho tutelar, que descobriu sobre os maus-tratos.


Os pais de Rosa fugiram antes mesmo que a investigação tivesse sido concluída, fugiram antes que o filho, que estava em estado grave, chegasse a óbito. Os dois simplesmente o abandonaram internado, deixando os três filhos sem ninguém.


Rosa e o seu único irmão sobrevivente, passaram o resto da adolescência no orfanato. Vanda, ao escutar a notícia foi prontamente oferecer ajuda a garota, que ao completar 18 anos foi direcionada à ONG de Vanda, que na época ainda estava em reforma para se tornar o que é hoje. Neste meio tempo, a mesma perdera o contato com seu irmão, e mesmo que não diga, isso é algo que a incomoda.


Rosa não foi prontamente requisitada a participar do grupo secreto da ONG, Vanda não acreditava que a mesma seria capaz de acrescentar muito. Mas quando ela começou a se enturmar melhor, se abrir mais, Vanda percebeu o grande potencial que Rosa tinha. A benfeitora lhe pagou uma faculdade de Química, entre outros cursos técnicos na área da biologia.


Mesmo após estar no grupo secreto, e já tendo concluído algumas missões dentro do mesmo, foram necessários mais de dois anos até que os pais de Rosa fossem localizados e ela pudesse se vingar. Ela preferiu não seguir o exemplo de suas colegas, que escolheram uma morte rápida.


Os pais de Rosa estavam em outro estado, numa cidade interiorana morando em uma casa isolada. Perto dali, Rosa construiu um porão subterrâneo. Para não chamar atenção, Rosa, Jane e Vanessa (a mesma que hoje traiu o grupo), construíram o local com as próprias mãos, sem a necessidade de envolver pessoas de fora do grupo na obra. No projeto de construção, as mulheres fizeram questão de que as paredes de cimento fossem grossas e impenetráveis e que a porta de entrada fosse bem pesada e impossível de se abrir por dentro.


Rosa sequestrou seus pais durante a noite, quando os mesmos já adormeciam. Quando eles foram deixados no porão, com as mãos amarradas, a filha apenas os observava sem dizer nada. Havia muito rancor no seu coração, revê-los não estava sendo fácil. 


Os dois tampouco pareciam os mesmos, antes sempre andavam arrumados, e agora estavam velhos e usando maltrapilhos, o destino parecia tê-los feito pagar pelo que fizeram e Rosa seria a responsável por fechar o ciclo.


Rosa os explicou como desatar o nó que prendia as mãos deles, e os deixou com uma garrafa de água de 500 ml e um saco de 500g de farinha de trigo. A água já estava quente, mas era limpa, o saco de farinha de trigo estava furado, mas não estava estragado. Aquele seria o kit sobrevivência dos dois.


A química então os deixou lá, presos, impossibilitados de sair ou de serem escutados por qualquer um. O porão é abafado e a saída de ar era quase inútil. Rosa não sabe dizer quanto tempo levou para os pais falecerem, provavelmente de inanição. Ela retornara ao porão apenas 4 meses após a noite do sequestro e os encontrou num estado de decomposição muito avançado. Rosa não chorou, não se abalou, não sentiu nada. Apenas voltou a fechar o porão, deixando os restos de seus pais jazer ali para sempre.


Sempre empenhada a fazer o melhor, Rosa podia se dar bem em diversos tipos de missões, sendo muitas vezes útil em missões das outras colegas também. Com seus cursos e graduação, Rosa não só tem acesso aos químicos como tem o conhecimento para criar venenos fatais e letais. Quando gostava de algo mais simples, usava de armas para fazer com que seus alvos fossem atingidos. Algumas meninas acham isso ruim, pois geralmente Rosa atira de longe e o alvo não sabia o por que tinha sido alvejado, mas para Rosa o saber o porquê está morrendo, não é tão importante, o fundamental é o resultado final: menos um criminoso a solta.


No caso de hoje Rosa teria que se envolver um pouco mais do que geralmente gosta, a rotina do seu alvo é intensa e o mesmo raramente está sozinho, e para agir sem chamar muita atenção ela teria que ser esperta e paciente.


Durante todo mês ela observou a rotina de seu alvo. Geralmente essa observação dura pelo menos dois meses, mas seu alvo lhe facilitou muito a vida, seguindo horários e rotas fixas todo santo dia, passar mais 30 dias observando-o seria uma perda de tempo.


Ainda cedo ele se dirige ao trabalho no banco, a rota é curta, mas o prédio em que ele trabalha não oferece estacionamento, e ele tem que deixar seu carro num estacionamento pago que fica a duas quadras do banco, este era um dos seus momentos mais vulnerável.


Andando pelo caminho contrário, Rosa propositalmente esbarra no homem e para não cair com a trombada, ela segura forte em seu braço. O homem tem dificuldade para não cair sobre Rosa, o susto pela pancada lhe deixou despreparado e a forma quase agressiva que a mulher desconhecida o segura, não o deixa confortável.


Rosa retoma seu equilíbrio e pede desculpas ao homem, que a olha de cima a baixo e não fala nada em retorno.


Sua falta de educação já era de conhecimento de Rosa, o mesmo parecia tratar quase todos a sua volta com ignorância.


Enquanto o homem volta a sua rota até seu trabalho, Rosa começa a sua espera.


Seu plano era simples, começara no momento em que os dois "acidentalmente" trobaram. De forma discreta Rosa segurava em sua mão uma agulha embebida num veneno não difícil de produzir, tampouco difícil de se detectar, mas que em uma boa dose, leva alguém ao óbito em questão de minutos. Este porém não era o objetivo de Rosa, a quantidade que ela conseguira injetar através da agulha era ínfima, mas faria seu efeito no tempo certo.


Os primeiros sintomas irão surgir em torno das próximas 4 horas, com fortes dores abdominais. Rosa espera que o seu alvo acredite que tudo não passa de uma indigestão pós almoço e que não se importe o suficiente para ir a um médico ou retornar a sua casa antes da hora, mas caso uma das duas situações venham a ocorrer, a mesma tinha como contornar tudo a seu favor.


Hoje é o dia em que a sua doméstica, que fica 24 horas no trabalho, tem uma folga. A mesma ficaria 8 horas longe, deixando-o sozinho, mas caso ele retornasse para casa cedo demais, enquanto a empregada ainda não finalizara seu turno, ela poderia acabar levando-o ao hospital. Para impedir que isso ocorra, Rosa, conseguiu, de forma astuta, furar o pneu do carro do homem, mesmo o carro estando estacionado num estacionamento privado e vigiado. Isso não o impedirá de retornar a sua casa, mas o atrasaria, o que seria o suficiente para ela.


Caso o mesmo fosse procurar um hospital, o mais próximo, coincidentemente, é o que Sofia trabalha, se ele por lá fosse, Sofia a ajudaria a mandá-lo para casa no momento e horário que fosse mais oportuno para Rosa.


Por sorte, o plano mais fácil funcionou, o homem, mesmo com dor, manteve-se trabalhando até o final e quando chegou no estacionamento, furioso, fez com que os funcionários do local trocassem o pneu. O tempo ali perdido já tinha sido mais que suficiente para que a empregada do alvo de Rosa deixasse a residência dele.


Pelo suor que escorria da testa do homem e sua feição pálida, Rosa sabia que o veneno já estava agindo. Explodindo-o vagarosamente por dentro, a começar pelo intestino. Até o fim daquele dia, todos os órgãos daquele homem vão estar rompidos.


Pelo caminho de volta, Rosa persegue o homem com sua moto, e o mesmo, provavelmente sentindo dores horríveis, dirige pessimamente, quase se coloca em um acidente por pelo menos umas três vezes. Quando chega em casa, sai do carro se arrastando, Rosa não sabe dizer se o mesmo já pediu ajuda ou socorro médico, então, mesmo sabendo que ele ainda agonizaria por pelo menos mais 4 horas até finalmente morrer, ela decide agir rapidamente.


O homem não se preocupou (ou talvez não tenha conseguido) em trancar a porta de entrada, Rosa entra na grandiosa casa dele sem precisar se esforçar. O mesmo não tem cachorros ou qualquer animal que pudesse denunciar sua presença, a casa não possui nenhum sistema de segurança. Fácil até demais.


Rosa o encontra debruçado sobre a pia na cozinha, ele cospe sangue e a olha com ar de esperança.

– Socorro. - ele diz com dificuldade, o mesmo já respira com esforço. – Não sei o que... Está... Acontecendo. - puxa o ar com força. Talvez o efeito nele estivesse mais forte do que os cálculos de Rosa indicavam, na situação em que o mesmo está, ele não passaria mais que 2 horas vivo. Talvez ele tenha algum tipo de doença crônica que esteja acelerando seus sintomas. Entretanto, isso tampouco importa, Rosa tem mais o que fazer.


Sem mais hesitação, Rosa tira do bolso da sua calça jeans um par de luvas e logo após, duas fotografias que haviam sido dobradas em quatro partes. Na imagem estava a ex-mulher do homem e a filha do casal, quando a mesma ainda tinha apenas dois anos de idade. Rosa joga as duas imagens sobre a bancada que fica ao lado da pia em que o homem se escora.


Seus olhos se arregalam e ele torna o olhar para Rosa, confuso.

– Você a matou por ciúmes, na frente da sua filha, quando ela tinha 4 anos. - Rosa é direta. – 28 facadas por todo o tórax da sua mulher. - o homem procura por um suporte, para que possa se afastar de Rosa, que se aproxima cada vez mais dele.

– Não fui eu. - desiste de fugir. – Foi o amante dela. - sua voz sai por um fio.

– Foi nisso que a justiça acreditou, mesmo com a menina jurando ter visto o pai cometer o crime. Um homem inocente ficou 10 anos na cadeia pelo que você cometeu.

– Foi ele. - o homem lentamente cai sobre o chão da cozinha. – Foi ele. - repete.

– Faz dois meses que conseguiram provar a inocência dele, finalmente concluíram que a imagem da câmera do estabelecimento em que ele trabalhava na hora do assassinato era real e prova o suficiente para inocentá-lo.

– Injusto. - se limita a dizer.

– Injusto? - questiona Rosa. – Realmente, foram necessários 10 anos para verem o obvio. A sua palavra sozinha se valeu por cima de todas as outras evidências, sobrepôs a voz de sua filha, se sobrepôs às imagens dele no local de trabalho, sobrepôs a todas as testemunhas que foram depor a favor dele...

– Se... - respira fundo. – Se está achando... Que não me importo... Que sou... Culpado... Só porque não... Reabri o... Caso... Não é... Verdade... Só acho que... Ele já... Pagou.

– Pagou pelo quê? Por ter se envolvido com uma mulher casada? Esse foi o crime dele. Agora, 10 anos na cadeia por uma traição é um pouco demais, não é?

– Foi ele. - mais sangue corre por sua boca, Rosa pode ver pelo seu olhar que o mesmo está dominado pela dor, mas nem mesmo forças para gritar ou expressar a dor ele tem.

– Todas as evidências apontavam para você, apenas sua palavra apontava para ele. Todo mundo sabe que foi você, mas ainda assim quem foi parar na cadeia foi ele... Eu me pergunto, esse resultado teria sido diferente se você não fosse um homem branco, com boa condição financeira, amigo de pessoas importantes na política e ele não fosse um simples porteiro, negro, pobre que ainda morava com a mãe? - o homem não diz nada. – O que te irritou de verdade foi o fato dela ter te traído ou o fato dela ter se interessado por homem como ele? Pobre e negro... Ela estava para escolher ele, não estava? Ela ia te largar para ficar com ele. - o homem tosse e mais sangue sai por sua boca.

– Aquela vadia está no inferno. - quase rosna ao falar.

– Se assim for, em breve você vai encontrá-la. - Rosa responde com desdém.

– Eu chamei o socorro, vão me salvar e você vai apodrecer na cadeia, sua idiota.

– No estado em que você está não existe nenhuma possibilidade de ser salvo. - Rosa diz.


Se o efeito estivesse um pouco mais brando, Rosa não poderia descartar a possibilidade do homem sair vivo no caso de ser socorrido em breve; mas por alguma razão, talvez uma doença prévia ou o uso de algum medicamento controlado que ajudava na condução do veneno na sua corrente sanguínea, o efeito está bem mais forte e mais rápido. No ponto em que está, no melhor (ou pior, para Rosa) do casos, ele seria colocado em coma induzido e posto imediatamente numa hemodiálise (sem garantias de que isso funcionaria). Para salvar-se o mesmo teria que ter procurado ajuda ainda na primeira hora do primeiro sintoma, e teria que torcer para que os médicos suspeitassem de pronto do envenenamento, caso contrário, nem mesmo isso teria o salvado.


Rosa escuta o barulho das sirenes se aproximando, o homem não estava blefando, ele havia chamado o socorro.

– Você vai se fud... - Rosa agarra os cabelos do homem e com toda sua força bate a cabeça dele duas vezes contra o chão. A força que a mesma faz é tão grande, que ela pode escutar o trincar do crânio dele, se foi uma fratura grande ou pequena, naquele momento não importava, ela só o fizera para que o homem desmaiasse e assim não falasse sobre ela aos socorristas. Se tiver sorte, quem socorrê-lo achará que uma queda provocou tal ferimento em sua cabeça. Fora isso, Rosa sabe que Lisa estará no IML e se encarregará de esconder toda e qualquer evidência de um envenenamento.


Enquanto os socorristas entram na casa, Rosa corre para se esconder no segundo andar da residência. Ela sabe que muito em breve policiais também seriam chamados ao local, devido a estranha morte do homem, por isso ela teria que ser rápida na sua fuga, afinal sua moto estava estacionada bem em frente a casa, isso poderia gerar suspeitas o que levaria a um investigação direto para ela.


Ela escuta os paramédicos se comunicarem, tentando reanimar e imobilizar o homem que não tem mais salvação. Cuidadosamente ela abre a janela de um dos quartos da casa. A janela dá para a área de trás da casa, e se ela quisesse sair de lá rápido, teria que pular.


A queda não é agradável, mas Rosa não tem tempo para se recompor adequadamente, e ainda sentindo as dores do impacto da aterrissagem se levanta e corre, dando a volta pela parte de fora da casa, tentando sair pela porta da frente, onde está sua moto, mas logo um dos socorristas a vê e desconfiado vai até sua direção.


Rosa age rápido e antes mesmo que o socorrista consiga se aproximar o suficiente, ela corre para o outro lado, entrando mais no quintal da casa do homem que ela acabara de matar.


O socorrista é rápido, mas Rosa ganha vantagem quando a mesma começa a escalar o muro que separa a casa em que estão, da casa do vizinho. Por sorte não há nenhum animal que ataque a Rosa nessa invasão improvisada, e quando o socorrista, com muito esforço, consegue subir no muro, ele para sentado ali mesmo, desistindo de persegui-la, sem dúvidas ele chamará reforços. 


Agora, Rosa, para se livrar, teria que contar não só com a ajuda de Lisa no IML, mas também de Vanda na delegacia. 






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