Felipe sai do carro e corre para ver o que causara. Sofia, a contra gosto vai atrás.
– Ele morreu? - ele pergunta enquanto Sofia procura pela pulsação do homem que está desacordado e tem arranhões nos braços, mas não apresenta nenhuma fratura exposta nem sangramento externo.
– Não. - para o azar (ou sorte) de Sofia, o seu alvo estava bem vivo.
– Você consegue fazer algo? Ele tá apagado. - Felipe pergunta.
– Farei os primeiros socorros, mas é melhor já ligar para a emergência. - Sofia diz sem ânimo nem urgência.
Após 10 minutos chega a primeira viatura, Sofia não sabe se são policiais da delegacia de Vanda, mas torcia para que fossem. Mais 5 minutos se passam até que a ambulância finalmente chegue para levar o homem, ainda desacordado, até o hospital. Sofia torce para que seja o hospital em que trabalha, apesar de pelo que ela pôde avaliar do homem, ele não parecer ter sofrido nada grave e seu desmaio possa ser mais pelos sonífero do que pelo atropelamento em si, caso amanhã cedo ele ainda esteja internado, ela sabe que lá ela terá uma nova chance de terminar seu serviço e impedir que ele abra a boca.
– Sofia o seu nome, correto? - um dos policiais chegam próximo a ela. Ele está fardado, tem uma barbicha engraçada e olhos negros, um pouco mais baixo que Sofia, não está 100% em forma, parece já estar na meia idade e não muito longe de se aposentar.
– Sim.
– Gostaria de tirar seu testemunho. Para entender o que aconteceu.
– Foi apenas um acidente. - ela resume e o policial ri da pressa da moça.
– Eu sei disso. - ele diz divertido. – Mas preciso de detalhes e pegar algumas informações suas também. Só para concluir a chamada. - diz como se não fosse nada. – Já falei com o colega ali, mas preciso das duas versões. - explica. – Ele disse que vocês dois estavam juntos, que você e o acidentado iriam ir para algum lugar juntos quando ele interveio. Você confirma essa história?
– Sim. - Sofia decide que irá responder da forma mais simples possível e assim evitar qualquer chance de se comprometer.
– Você me confirma que o nome da vítima é Arnaldo? - o policial questiona.
– Sim.
– E de onde você e o Arnaldo se conhecem?
– Daqui mesmo... Do bar. - o olhar do policial pede por mais e Sofia completa. – Nós nos conhecemos hoje. - o policial então olha para Sofia de cima a baixo, ele não diz nada de inicio, mas pelo seu olhar ela sabe o que ele está pensando: Seu vestido com uma fenda aberta na perna direita, que deixa suas grossas e torneadas coxas amostra, juntando com seu decote era provocante demais.
– Você tem que ter mais cuidado como sai e com quem sai. - ele a aconselha. – Você teve sorte. Você pode ter sido salva pelo nosso colega de farda ali. - aponta para Felipe, que conversa com outros policiais. Sofia quer revirar os olhos, mas apenas dá um sorriso forçado. – Eu vou precisar dos seus documentos e endereço.
– E porque? - Sofia questiona, ela até tem seus documentos, mas ela não não gostaria de tê-los que mostrar e assim, mesmo que de forma acidental, entrar no sistema da polícia.
– É protocolo, só para o caso desse incidente gerar algum tipo de investigação... Não creio que vai dar em nada. - ele a tranquiliza. – A vítima não tem uma boa ficha criminal, o motorista em questão já fez teste do bafômetro e está limpo, a vítima acabaria se dando bem mal caso decida abrir um processo, no final ele está até mais errado, atacando a vocês.
– Então porque dos documentos? - o policial levanta uma das sobrancelhas.
– Me desculpe... Está sendo uma noite longa. - Sofia disfarça. – É protocolo e eu vou respeitar.
...
Após permitir que os policiais pegassem as suas informações, os mesmo partem sem levá-los a delegacia, o fato de Felipe ser policial e a vítima do atropelamento ter uma ficha considerável fez com que os policiais não quisessem levar o caso mais adiante.
Sozinhos e com a noite prestes a virar, o reboque do seguro chega para levar o carro de Felipe para o mecânico da seguradora; Sofia então decide que já é hora ir embora, Felipe aproveita e decide pedir um favor.
– Você pode me dar uma carona? Não estou hospedado tão longe daqui, mas... Eu posso pagar a gasolina. - ele pede. Sofia queria negar, seria o mais inteligente a se fazer, afinal, seu carro está cheio de ferramentas que denunciariam que algo está errado, mas como ela poderia dizer não sendo que há pouco tempo ele estava disposto a dar carona para ela? Se não fosse no mínimo uma ação má-educada, poderia até mesmo ser considerada uma ação suspeita.
– Tudo bem. - Sofia responde após um longo suspiro.
Quando Felipe lança um olhar para o banco traseiro, em que uma sacola preta e bem grande está disposta, o coração de Sofia erra o compasso. Dentro daquela sacola há duas pás e uma picareta que estavam preparadas para a missão de cavar uma cova rasa, onde o alvo de Sofia seria enterrado, mas agora a missão estava cancelada. O policial em questão não decide se importar com o estranho saco no banco de trás, mas não pode deixar de perceber a tensão da enfermeira.
– Está tudo bem? - ele pergunta.
– Claro. - ela ri para disfarçar.
– Se eu estiver incomodando...
– Não, não é incomodo nenhum. - Sofia o interrompe e dá partida no carro. – Você não me passou seu endereço. - ela percebe. – Coloque no gps do carro, que assim não tem erro. - ela pede. O policial obedece e após saber para onde ir, Sofia segue pela rua perpendicular a do bar e entra em uma grande avenida, que neste momento está quase totalmente vazia.
– Você tem medo de mim? - Felipe pergunta, após os dois passarem breves segundos em total silêncio.
– Não. - Sofia responde sem titubear. Felipe ri e ao estranhar sua reação ela pergunta. – Porque? Eu deveria?
– Talvez. - ele responde. – A primeira vez que você me viu eu estava ensanguentado, fui um grosso e agora eu te atrapalho num encontro e para completar eu atropelo uma pessoa. Em pouco tempo eu só te encontrei em situações... Situações no mínimo inusitadas. - ri e Sofia o acompanha.
– Sobre o hospital, acontece. - ela responde ao virar a direita numa rua estreita. – Você não foi o primeiro... Louco... - ela o olha de esgueio para ver sua reação e ele parece divertido com sua descrição, ao constatar isso, ela continua. – ...que me apareceu no hospital, na maior parte das vezes estou na área de emergência e pronto atendimento, já vi de tudo um pouco.
– Ainda assim, me desculpe, você estava fazendo seu trabalho, muito bem feito por sinal, acho que não vai ficar nem marca. - diz apontando para os pontos em sua cara.
– Vai ficar sim. - Sofia ri ao responder. – Mas nada que te deixe feio.
– Você me acha bonito? - ele pergunta e Sofia para num sinal vermelho. Ela não responde de pronto, parece perceber apenas agora que a conversa estava tomando um rumo bem inesperado.
– Sim. - responde não demonstrando muita empolgação, como se a beleza dele não significasse nada para ela, o que não deixa de ser uma verdade. Tímido, o policial então se cala.
O silêncio torna a dominar o carro e poucos quilômetros separam os dois do destino final do policial. Após pensar muito sobre sua ideia, Felipe decide fazer a pergunta que tanto queria.
– Sabe... - ele tenta iniciar com uma breve introdução que embase seu pedido, para que assim ele tenha mais chances de sucesso. – Eu acredito que terei que ficar mais tempo que o previsto aqui na cidade, por causa da procura pela verdade sobre a morte do meu irmão... - ele começa a se enrolar e quando Sofia vira a direita chegando no quarteirão do Apart-Hotel do qual o policial estava morando, ele sente a pressão para chegar a uma conclusão. – Eu não conheço ninguém aqui, nem nada, toda vez que saio acabo arrumando alguma confusão... Você está sendo bem gentil comigo mesmo depois de tudo e não se assusta fácil... Eu estava pensando... Talvez fosse melhor se eu tivesse alguém que pudesse me ajudar um pouco... Não sei... Você poderia ser minha amiga? - pergunta e Sofia freia o carro bem frente ao local em que Felipe ficará.
Sofia parece confusa no início e o olha. A enfermeira percebe que ele está ansioso por sua resposta.
– Amiga? - Ela pergunta desconfiada.
– Sim, seria mais para... Sei lá, sairmos de vez enquando... Se você puder me apresentar a lugares novos... Ser um rosto conhecido, alguém de confiança para mim nesta cidade. - ele tenta explicar melhor o que quer.
Sofia sorri gentil, sabendo que a resposta certa a se dar seria um "não", mas no fim ela aceita.
– Bom... Acho que não há nada de errado em sermos amigos. - responde.
Nenhum comentário:
Postar um comentário